domingo, 27 de novembro de 2011

Coluna de Manuel Fragata de Morais - Momento de ilusão - Contos - CARTAS



Coluna de Manuel Fragata de Morais - Momento de ilusão - Contos - CARTAS
Minha Genoveva,
 
 Senta-te para que não caias de surpresa, já que é a primeira vez que nos falamos e poder-te-á ser, ou não, agradável o que vou contar.

Quando o meu bisavô foi para as Africas, já lá vão precisamente 98 anos, certamente ninguém pensou na sua aldeia que voltasse, mas foi o que fez, como talvez saibas. Deixou aí filhos com uma lavadeira negra, um deles o teu avô, de nome Miguel Gomes, só isso é que sei. Parece que vivia em Benguela e o teu pai ou a tua mãe, cujos nomes não conheço, se ainda forem vivos, por certo saberão confirmar o que digo. Sou, pois, tua prima afastada, sendo o nosso bisavô o mesmo, já que ele aqui tornou a fazer filhos, tendo-se casado com a minha bisavó, D. Engrácia Gomes.

Fique muito feliz quando recebi do consulado português em Luanda a indagação se por acaso um tal José Armando Gomes seria aquele que estivera em Angola de 1900 a 1930 e cujo assento de baptismo de um filho, Miguel Gomes, constava na paróquia do Carmo em Luanda. Acho que terás sido tu a inquirir, pois foi esse o endereço que me foi fornecido.
O resto, é este primeiro contacto. Manda-nos fotografias tuas e da família, explicando tudo muito bem, quem são e como estão.

O retrato que anexo, é do Augusto, meu marido, eu e o nosso filho Tobias, tirado no jardim zoológico o ano passado, quando fomos a Lisboa de férias. Por acaso tirada ao lado dos elefantes, quando ainda não sabíamos que tínhamos parentes em Africa, vê lá.

Tua prima que te adorará conhecer um dia.

Ana Rita

P.S. Que cor és?...



Mário Maldonado ao chegar a casa, encontrou a carta aberta em cima da mesa na sala de jantar. Certamente que a mulher aí a tinha deixado para que ele a lesse. Momentos depois, quando esta saiu do quarto, jocoso, perguntou, à guisa de cumprimento:

«Então foste descobrir uns pulas teus parentes na meloi?»
De facto assim fora. Genoveva descobrira uns documentos guardados em um embrulho de papel castanho meio comido pelas traças, numa mala com coisas que tinham pertencido a sua mãe, que davam a entender que talvez pudessem ser de seus familiares. Sem dizer nada ao marido consultara os registos da igreja e contactara o consulado português em Luanda, que se prontificou a averiguar.

«Que mal há, são parentes e devemos conhecer as nossas origens.»





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