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domingo, 3 de maio de 2015

ABRE-TE CAMPA SAGRADA - Por José Francisco Colaço Guerreiro


DEPOIS DA CEIFA


ABRE-TE CAMPA SAGRADA - Por José Francisco  Colaço Guerreiro


O estio tinha vindo  temporão  e os trigais aloiraram mais cedo. No ar, o cheiro dos pastos  e das  searas maduras começou a sentir-se , quase um mês antes da época devida,  quando a meio da tarde se  levantava a maré e os ventos  passavam  perfumados pelos aromas  dos campos a ressequir.

Pelos cheiros e pelas vistas, os almocreves  pressentiam o aproximar do tempo das ceifas . Olhavam os céus , miravam o horizonte e  ao por do sol , tiravam sinais. Todos os dias, entravam nas semeadas e  apanhavam uma espiga ao acaso para esbrugarem na palma da mão.  Depois sopravam  deixando  ficar só o grão e  assim  já sabiam a grada da semente, calculavam as fundalhas  , avaliavam  a oportunidade do inicio das colheitas e disso tudo,   davam  conta aos patrões.

Não tardaria a haver trabalho, durante quase dois meses, para aqueles que nas empreitadas ou à jorna, tivessem  forças para aguentar  o manusear da foice e as farpas do sol  cravadas nas costas, todo o santo dia.

Os seareiros, as mulheres e os mais idosos ficavam sempre pela aldeia, resignados às pagas fracas dos lavradores dali .

Os mais vigorosos, abalavam estrada fora, manta às costas, balsa ao ombro, direito às terras dos barros onde os suplícios do corpo podiam ter  melhor preço. Despediam-se da família como se fora para sempre, sem dia de regresso marcado, sem contactos possíveis para além de uma notícia ou outra, levada ou trazida por um portador de acaso.

Na véspera da abalada, o Florival, um cantarrista afamado, bebeu e abalou  a moda toda a tarde e noite dentro, na venda do Encarnadinho. Doía-lhe a alma por ter de  deixar a mãe velhota sem o seu amparo, sem ter quem lhe carregasse uma quarta de água, sem ter sequer quem lhe migasse as sopas. Ficava sozinha,   entregue à boa vontade das vizinhas que por ela olhariam como pudessem .

Mas os fiados que tinha eram muitos, à conta das sacas de farinha, do azeite e do petróleo, dos copinhos e das onças de tabaco, consumidos durante meses  a fio, sem ter como os pagar.

E numa madrugada lá foi ele, mais meia dúzia , cantando a moda,  rumo a norte, por caminhos sem nome, sem destino certo. A tristeza fazia-os cantar mais do que as alegrias. Sempre fora assim.

Passado mais de  um  mês de tormentas em mares de trigais e cevadas, naufragado em ondas de calor, com as roupas retesadas pelo suor destilado  nas fornalhas do trabalho, o Florival com mais meia dúzia de ganhões, estavam de volta a casa  . Vinham cantando do rijo,   ele agora satisfeito pelo regresso e  por poder pagar as dívidas com o  que   trazia  na algibeira da  garibalda,  apertada com a  pregadeira que lhe tinha tirado os  bicos dos mil cardos espetados nas mãos ao agarrar o pão para o traçar com a foice.

Mas  mal chegaram aos arrabaldes  da aldeia, a sua voz foi notada e toda a gente estremeceu. As mulheres saíram dos postigos e  vieram para a rua de mãos na cabeça. Na venda, os homens calaram a moda e  juntaram-se em magotes  cá fora.

Dois deles, mais afoitos ou com melhor perna, caminharam ao  encontro dos cantadores  ,  a passos largos, para lhes darem a conhecer a novidade.

O ar grave que levavam , antes que falassem, já tinha revelado que se tratava de uma má nova. Depois dos cumprimentos breves , um ,  disse que a mãe do Florival  tinha morrido e o outro completou a noticia, dizendo que ela se tinha afogado no poço da horta, havia três dias.

O  ganhão, varado pela dor,  sentou-se  numa rocha à beira do caminho e lá quis ficar só.

Mais tarde,   ergueu-se e lançando o olhar em direção ao cemitério da aldeia, como que retomando a moda interrompida  ou como que rezando a seu jeito,  cantou baixinho:

“Abre-te oh  campa sagrada

Que a minha mãe quero ver

Quero-lhe beijar o rosto

Antes de a terra o comer”


(Texto escrito para o ultimo CD do Vitorino e Janita Salomé )





sexta-feira, 1 de maio de 2015

As Jóias da terra - Texto de José Francisco Colaço Guerreiro


As Jóias da terra

Texto de José Francisco Colaço Guerreiro

 
As jóias da terra são os recantos onde os meninos brincam agachados, empurrando carrinhos, imaginando estradas infindas, seguindo com o olhar uma folha levada num regato como se fora uma embarcação num rio caudaloso. São as esquinas, as calçadas que se pisam amiúde e já se lhes adivinha os rebaixos e os encalhos, são os poiais que diariamente se sobem e no verão servem de assento para se apanhar o fresco depois da ceia enquanto se cavaqueia e o calor do dia se vai despegando do corpo.

 São as ruas, feitas de mil passos, das gentes que nelas andaram percorrendo a vida, andares todos diferentes que gravamos na retina e depois mais tarde, continuamos a visualizar em cenários de saudade. Ruas caiadas, de barrinhas feitas com craveiro á porta que o povo baptizava com nomes seus, por motivos relevantes, mas que as placas toponímicas chamam agora com a graça deste ou daquele que nunca sequer as pisou mas por ser de fora, por ser figura nacional, passou a ser a nossa direcção.

 Jóias da terra são os jardins onde as pessoas descansam e convivem , onde se sentem bem como em casa e por isso fazem entrar nos seus hábitos de lazer. São os largos, cheios de abraços, cumprimentos, falas e afectos, onde se faz uma pausa, se pousa o saco das compras, se dão e recebem novidades. Onde se espraia o sentimento de estarmos num lugar nosso e por isso nos demoramos sem cuidados.

 São as vendas e as mercearias, onde se compram só as precisões e ao balcão também se despacham palavras de amizade, embrulhadas em gestos carinhosos de um sentir verdadeiro, se necessário solidário, desprendido da ganância pura dos neons onde não se vende fiado.

 Jóias da terra são as rádios locais que manhã cedo nos acordam falando do que temos e daquilo que nos falta, seguem dia fora tocando as músicas de cá, afugentando tanta solidão, dando tanta companhia, e até à deita, persistem elogiando os nossos valores, enaltecendo as nossas obras, fazendo eco dos nossos sonhos.

 São os clubes e as associações, as comissões de festas, que engendram maneiras de ocupar, dinamizar, recrear e valorizar as gentes, envolvendo-as, responsabilizando-as, fazendo delas artífices do seu bem estar e não meros consumidores da animação.

 Jóias da terra são os poetas populares, os artesãos, os tocadores e os cantadores que ainda inventam brio nesta vida cinzenta para continuarem a levar por diante os testemunhos da tradição.

 Gente sem pelouros nem obrigações mas que não regateiam tempo do seu tempo para dar e dedicar às coisas que outros pensam ser já de outro tempo.

 Lembramo-nos do Antero que em Amoreiras Gare estrebucha por paixão à terra. Não tem horário nem mau jeito, nem há contrariedade que lhe trave o passo na sua caminhada para fazer valer os trunfos da cultura. Por devoção, todos os dias acende a vela da esperança de ver melhorar o pensamento que agora nos arreda daquilo que é nosso, das nossas raízes e dos nossos costumes.

 Pacientemente insiste em não se deixar ofuscar pela modernidade reinante que do passado pretende fazer terra queimada e acredita também que num futuro, não importa quando, os valores culturais locais possam vir a ser uma jóia comum e os nossos meninos já com os olhos despregados da televisão, possam imaginar grandes veleiros ao ver passar uma folha arrastada num regato.




quarta-feira, 18 de março de 2015

A ESCOLA - Por José Francisco Colaço Guerreiro


A ESCOLA

Por José Francisco Colaço Guerreiro

Recolhido em Património



 A escola era a primeira grande contrariedade da nossa vida. Se calhar, foi assim desde sempre e até há bem pouco tempo, quando a moçada inverteu as regras e passou a dominar, exigindo com gritos e prantos, tiranizando com rebeldia e desassossego.

Mas dantes, a escola era o verdadeiro desmame, o largar as saias, o caminhar sozinho, balsa às costas, para aprender a ser homem, numa caminhada que se completava mais tarde, depois das sortes, a marchar em pelotão, espingarda às costas.

 Os primeiros gatafunhos eram feitos numa pedra de ardósia encaixilhada a madeira de cor natural que depois ia escurecendo e ganhando lustro com passar do tempo e dos dedos, às vezes besuntados de agarrarem o pão com banha salpicada de açúcar. Os lápis eram da mesma pedra , muito redondinhos e afilados, do tamanho de um palmo, forrados a papel numa das pontas, num axadrezado verde, vermelho ou azul, de tons desbotados, talvez pela cola.

 Quando se acabavam os compradiços, faziam-se de talisca, raspados à faca e rolados no chão para os adelgaçar e lhes arredondar a forma. Usava – se como acessório um frasquinho de remédio vazio, para encher com água e depois molhar num farrapo com que se limpava a escrita. Era esse o bom proceder, mas muitas vezes acontecia usar-se o cuspinho e a manga da blusa para o mesmo efeito.

 Com as brincadeiras, empurrão de um moço, chulipa de outro, rasteira ou escorregadela do cardado das botas nas calçadas polidas, vinha a balsa ao chão e a pedra partia-se. Um pranto até casa, baba e ranho com fartura, queixas e mais queixas para comover, depois, tareia, perdão ou castigo e com muita sorte, lá se arranjavam dez tostões para comprar outra, novazinha, para no outro dia mostrar: ao professor os trabalhos; aos colegas a brancura da moldura, ainda sem dedadas nem borrões de tinta.

 Pior do que tudo, ainda pior do que disciplina do erguer bem cedo, do estar comportado horas a fio sentado numa carteira, dos trabalhos de casa, da falta de tempo para a brinca, eram os maus tratos que os professores davam.
Empinar a tabuada numa cantarolada colectiva, saber conjugar os verbos num recitar decorado, desfiar os nomes dos rios, das serras e das estações dos caminhos-de-ferro, daqui e dalém mar em Africa, era empresa pequena face à afronta da sujeição de se estar uma manhã inteirinha à janela da escola com as orelhas de burro enfiadas na cabeça. Mas mais custoso ainda, eram as ponteiradas fazedoras de galos que nos arrepiavam mesmo quando estoiravam nas cabeças dos outros.

 E as meninas de cinco olhinhos, palmatórias concebidas para extrair uma dor máxima de quem as experimentava, com o esforço mínimo de quem as manobrava, eram verdadeiros objectos de tortura que o próprio sistema acabou por proibir.

 Mas sucederam-lhes as réguas, de pau-santo ou madeira rosa, bem grossas e pesadas que era para fazer arder. Os professores tiravam as malditas, de um castanho avermelhado, da gaveta da secretária no princípio do dia e estendiam-nas ao seu lado, em cima do tampo, bem à vista de todos.

 Eram os problemas mal resolvidos, os erros dos ditados, as falhas de memória, o azar de se ser criança em tempo cinzento que davam azo a tanta reguada. Havia tabela. Tantas por cada erro e tantas por cada conta mal feita. Tantas por isto e outras tantas ou ainda mais por aquilo. O bater fazia parte das regras, como agora faz parte não contrariar os miúdos e deixá-los ter o protagonismo todo.

 Mesmo os pais, numa atitude de alguma inferioridade, subserviência ou temor reverencial face ao professor, não raro diziam ou mandavam o recado: chegue-lhe! As que caem no chão são as que se perdem! Desde que não lhe parta braço nem perna…chegue-lhe!...

 A escola só era suportável uma ou duas vezes no ano quando o professor Abílio cá vinha dar, trazendo de Beja uma maquineta para passar filmes com desenhos animados de coelhos a comer cenouras e mosquitos que picavam e depois davam febrões.

 Nesse dia havia tréguas. As réguas malditas de um acastanho avermelhado não saíam da gaveta. Corriam-se os estores e penduravam-se panos de flanela preta nas janelas para fazer escuro. Era um alívio.

 Mas logo voltava o fadário dos ditados, das contas, das idas ao quadro e depois…das reguadas. Cinco numa mão. Cinco na outra. Quando anteviam a zurzidela, os miúdos iam à cerca do Virgílio Lagartinho à busca de cebola albarrã e untavam as mãos muito bem untadas. Havia a crença de que com tal fricção a carne não doía e se a mezinha fosse bem feita, até podiam fazer estalar a régua. Que se saiba não passou de crença.

 Mas quando eram apanhados desprevenidos, sem preparação prévia, as pernas tremiam, os braços esticavam-se devagarinho, alternadamente, a muito custo e apetecia tirar a mão na hora certa, para sair em falso a palmatoada e verem o professor atingir-se. Mas ninguém o fazia, porque eles iravam-se e ainda se entornava o caldo. Aguentava-se como se podia, menos as lágrimas porque essas escorriam imparáveis.

Passo largo para o lugar. As mãos inchavam de dor. Sem saber o que lhes fazer, metiam-se entre os braços num gesto instintivo como que para esconder. Logo a seguir cuspiam nelas e agarravam os ferros da estrutura das carteiras. Ouviam-se chiar. Se havia força para pedir para vir cá fora ou se a zirga acontecia pouco antes do intervalo, a custo tiravam a gaita e lavavam-nas na urina nem sempre contida. Também era mezinha. Aos outros, mais tarde, dizia-se que era remédio santo.

 Nas memórias de um tempo cinzento talvez existam escolas coloridas, com rodas e risos de meninos, mas a nossa só ganhava alguma cor quando os panos de flanela preta tapavam a luz das janelas e por uns momentos, víamos os bonecos que o professor Abílio trazia de Beja.




sexta-feira, 6 de março de 2015

AS DEBULHAS - Por José Francisco Colaço Guerreiro


AS DEBULHAS - Por José Francisco Colaço Guerreiro

Recolhido em Património

 
Em volta dos montes e de roda das vilas, buscavam-se lugares planos, com o terreno firme, de preferência rochoso ,onde se faziam as eiras. As primeiras eram de planta circular , maiores ou menores ,conforme a abastança e o tamanho da corda que prendia as bestas, forçadas a andar de roda vezes sem fim para pisar o cereal, a fava e o grão por descascabulhar.

 Se as estrumeiras medravam perto das arramadas e das cavalariças, chamadas «casinhas», mesmo juntinho ao casario e para onde desembocavam duas aberturas feitas nas paredes, as eiras, ao contrário, iam-se moldando ,marcando no chão de ano para ano, arredadas da porta .

 Tinham de ficar em sitio descampado por mor de apanharem bem o vento e com a orientação devida , para não encherem as casas de palhuço quando as forquilhas de pau se levantavam ritmadas, oferecendo a colheita à maré.

 Assim, foi durante séculos, mas assim só é ainda, nalgum ponto mais recuado da serra, onde as máquinas se temem a entrar e donde os viventes se recusam a sair.

 Depois das debulhas feitas à custa de braço e pateada, entrou em cena a tecnologia. Surgiram as primeiras máquinas debulhadoras movidas à força do vapor, verdadeiros encantos de potência e desembaraço que pelo modo como aliviaram a faina, ganharam a simpatia das gentes. Eram miradas na passagem e admiradas no desempenho.

 Tornaram-se vultos de ferro e simpatia , motivos de admiração e de algum afeto, a pontos de serem designadas por um nome próprio . Era a «pintassilga». Era a «caminheira». Eram outras mais que de caldeira acesa percorriam as eiras das freguesias.

 Anos depois, vieram as debulhadoras fixas mais ligeiras, de cor amarela no seu tabuado.

 Ceifado o pão e depois de enroleirado, era carregado para as ditas eiras. Só para as maiores que se enchiam de medas , dispostas conforme a variedade do cereal e segundo a dimensão da labuta.

 Na vila, havia debulhas no largo da feira e na eira da máquina, para onde os seareiros transportavam em carros e carrinhas a pequenez das suas colheitas.

 Mas as debulhas tinham grande encanto. Faziam soltar o sortilégio da abastança mesmo que esta fosse curta. Representavam o momento efetivo da devolução pela terra, em forma de semente, do trabalho nela investido em canseiras múltiplas.

 Contavam-se as fundalhas. Corriam nas conversas as finezas e as desgraças de todas as searas. Este fundiu bem, aquele nem dobrou a semente. Foi por mor da chuva, porque não espigou, pegou-lhe a aforra, não foi bem tratado, faltou-lhe o guano, a sementeira traçou-lhe logo um mau fim.

 E dantes os anos, muitos anos a fio, eram ruins. Feitas as contas, não sobrava nada.

 Mas apesar disso, as debulhas tinham o tal sortilégio de provocar encanto e de desenvolver uma mística de alguma paixão bucólica.

 Esperava-se com frenesim a chegada da máquina e contavam-se os dias que faltavam para a ver aproximar-se , lentamente, bamboleando-se, de tombo em tombo ,pela estrada velha. Lá vinha toda aquela arrearia ,toda aquela gente, todo o movimento que o pessoal da máquina ,durante dias, gerava no monte sempre sossegado.

 Encostavam a debulhadora à primeira meda, descarregavam a torgia, acilhavam, travavam os rodados de ferro, preparavam tudo com o preceito sabido.

 Diante da máquina, à distancia da correia de lona grossa, tomava posição o trator que depois, dias a fio, fazia zunir as engrenagens. Mais afastada ainda, ficava a barraca, melhor dizendo, um toldo, feito de sacas esticadas atadas nas extremidades de quatro paus. O bastante para fazer sombra. Juncava-se o chão para dar fresquidão e por ali ficavam as quartas de água e uns banquinhos. tipo mochos, onde o pessoal vinha desencalmar quando era rendido.

 O tratorista, andava por ali, para observar o maquinismo. O saqueiro, aparava a semente, despejava os alcofões dos desperdícios, contava os sacos e tirava a maquia. Lá em cima, mais perto do sol ,andavam os fiscaleiros e os alimentadores, tentando atafulhar a goela larga da debulhadora. Mas ainda cá em baixo, mais perto do inferno, sofria o homem da munha, coberto de pó, enroupado com sacas, empapado em suor, aparando os restos que o fagulheiro deitava.

 E à sombra do toldo juntavam-se também os cães do monte, um gato ou um galo que o pessoal da máquina gostava de trazer.

 Como eles, os moços procuravam o fresco do verde. Com a junça e na hora do descanso os homens mais habilidosos faziam artes. Tranças, cestinhos e bastões que pareciam ir nascendo de uma magia qualquer.

 De quando em vez, feita certa conta de sacos, o saqueiro tocava um apito para a rendição.

 Enquanto as medas minguavam iam nascendo e crescendo os cavalos e depois, as serras de palha .Eram os trabalhadores da casa, com a de cabeça tapada por um capuz de sapec que iam arrastando a palha com um rodo puxado por uma parelha de muares para o sítio apropriado.

 E à noite, depois da ceia, ia-se dormir à eira, ao relento, embrulhados na palha caso refrescasse.

 Passados dias, o monte voltava a esmorecer, quando era chegada a hora de vermos partir ,bamboleante ,aos tombos ,pela estrada velha, a máquina debulhadora amarela e no pó da estrada, ficava por um tempo, o rasto de uns dias diferentes que irradiavam a magia da abastança, mesmo que aparente.