sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Crónicas e ficções soltas - Alcoutim - Recordações XXI - Por Daniel Teixeira - A espingardinha



Crónicas e ficções soltas - Alcoutim - Recordações XXI - Por Daniel Teixeira - A espingardinha
 
Durante o tempo em que andei por Alcaria Alta já naquilo a que chamo a segunda volta, com cerca de 25/30 anos, eu dava as minhas voltas, muitas mesmo, pelos campos munido de uma espingarda de pressão de ar. Raramente apanhava pássaros em número de jeito, mas gostava de andar por ali, esgueirando-me entre as folhagens nas hortas, perto dos poços no calor do meio dia do verão, ou deitado nas palhas das eiras, apontando e quase nunca acertando.

De acrescentar, só para que o meu ego não fique desde logo destruído, que tive uma média razoável a tiro na tropa e que em princípio se deve à agilidade dos pássaros, ao seu tamanho inflacionado pelas penas e ao vento e a outros factores naturais o facto de eu ter uma percentagem de falhanços elevada: uma vez um tio meu - residente na cidade havia muitos anos - foi-me «fiscalizar» na viagem aproveitando para dar ele também uma voltinha pelas hortas. Levei uma descasca de todo o tamanho nesse dia. Apanhei um pássaro perante vinte ou trinta em posição ao longo dos caminhos.
Bem, mas o que interessa aqui é denotar uma coisa (não é para fugir à conversa sobre os falhanços como se irá notar): toda a gente, incluindo mulheres, achavam piada por eu andar com uma «espingardinha» e referiam-se á minha «máquina» com ar de gozo.

Na sua grande parte em casa deles e delas não havia espingarda de verdade (era muito cara e «desporto» de ricos) e nem sequer os seus filhos tiveram alguma vez uma pressão de ar como a minha pelo que era de supor que eu e a minha máquina fossemos respeitados pelo menos por estarmos um degrau que fosse acima das suas possibilidades. Nada disso...era a espingardinha e pronto!
 Chegavam ao ponto de me dizer que os pássaros sentiam «o cheiro a pólvora» por isso debandavam quando me viam: ora a pressão de ar é mesmo isso, trabalha a pressão de ar e a pólvora ou outro produto explosivo emanando cheiro ou não estão ausentes no processo.

Claro que reconheço que não existe comparação possível entre o meu vestir e andar à desportista e os caçadores de facto que pela época enchiam o rossio de carros logo pelo final da noite. Nem sequer os víamos de manhã, víamos os carros e jipes estacionados e lá pelo meio dia o seu regresso em direcção aos carros com paragem na taberna da Ti Inácia.



 

Sem comentários:

Enviar um comentário