Conto: Um natal com a avó - Por Gociante Patissa
Velha-Mbali encontrava-se a repousar no cadeirão da varanda desde a sua chegada. Confundiam-se, no bocejar, os solavancos da viagem e os restos do sono de quem madrugou para apanhar o primeiro autocarro intermunicipal da SGO. As pausas prolongadas e a economia de palavras eram parte da recuperação do efeito dos vómitos. A anciã teve o incómodo já previsível de usar saco plástico para lançar, foram três vezes nesta viagem de setenta quilómetros para ser mais preciso, uma fatalidade que decerto não será digerida nesta encarnação.
Qual sino de boas-vindas, o efeito acústico resultante do atrito entre a loiça e os talheres, enquanto punham a mesa, lisonjeava os ouvidos da hóspede. Chegava também com agrado a fumaça do peixe na grelha, que era a segunda paixão que Velha-Mbali guardava da cidade depois da família.
Velha-Mbali herdou da mãe uma beleza que compensava a estatura baixa do lado paterno. O rosto era a única vitrina para se lhe ver a pele semi-flácida, obra da idade. Usava panos compridos, de arrastar o chão, como manda a tradição. Os cabelos, maioritariamente brancos, salientavam a ligação entre o lenço e o quimone, ambos de tecido azulescuro de pintas brancas. A sorte de nascer imune à cárie era responsável pela capacidade de competir com os netos em matérias de mastigar, fosse o que fosse. Como é claro, empatava também na hora de palitar.
Muito grato, companheiros, pela divulgação. Uma boa semana para a equipa toda.
ResponderEliminarQue forma tão poética e maravilhosa de contar a realidade que é envelhecer e ao mesmo tempo o prazer de poder ter uma avó para passar os momentos dedicados a família, confesso que agradeço sempre a Deus, cada Natal que tenho a oportunidade de passar juntos dos mais velhos da minha família que cada vez tem menos avós...Obrigada G. Patissa
ResponderEliminarÉs um amor, Marta, que só grandeza interior se preocupa em divulgar outras valias. Um abraço
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