domingo, 4 de dezembro de 2011

Triste fado - Conto de VIRGINIA TEIXEIRA



Triste fado - Conto de VIRGINIA TEIXEIRA 
 
 Há pessoas a quem o fado é a tristeza e a espera. São pessoas a quem o olhar húmido é mais belo do que o risonho, e a quem um esgar de dor se torna com o tempo num sorriso apreciado por todos. São seres de olhar perdido mais além.

 Ela sempre foi fadada à tristeza. Eu adivinhava-o no rosto da criança pequena que ajudei a criar, e sempre soube mais do que os outros o significado daquele olhar perdido no além. Verdade seja dita que não quis crer e muitas vezes me repreendi por apreciar a beleza da menina quando as lágrimas se derramavam abundantes pelo rosto abaixo. Mas a idade traz sabedorias que temos de aceitar e na altura eu já a acalentava com mais doçura do que aos outros, mesmo que fosse ela a que menos retribuísse o carinho oferecido.

Era uma menina magra, de uma delicadeza de postura que contrastava com a pele morena e o cabelo rebelde. Nunca se deixava apanhar pela escova, ganchos e pregadores de cabelo, como as irmãs, e passava os dias em correrias com os meninos, tanto com os irmãos e primos como com os filhos dos que trabalhavam na casa.

 Eu sempre cá vivi, fui à cidade poucas vezes e foi aqui que construí a minha vida. Não sei nada do mundo longínquo, nem sinto falta desses saberes estrangeiros.

 Contento-me com o que aprendi com a patroa que, quando eu ainda era menina, se encarregou da minha educação, mais à laia de passatempo do que por dever cristão. Basta-me saber o que li ao longo dos anos e o que aprendi com as mulheres do campo que aqui trabalham. Dizem que tenho jeito para as plantas e, na verdade, não há planta que na minha mão não sobreviva.


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