Rápida memória - a tragédia do acidente radiológico na rua 57
Por Se Gyn
Uma bomba de aparelho de radiologia irresponsavelmente abandonada num terreno baldio no centro da cidade foi levada por catadores de sucatas e aberta, com a intenção de retirar o chumbo, para ser vendido, em 1987.
Tragédia.
Acharam graça no efeito luminescente do Césio 137 - cujos grânulos guardaram numa vasilha. À noite, eles brilhavam intensamente no escuro e, a linda e pequena Leide, consumiu alguns deles. A contaminação radiológica rapidamente se espalhou entre a vizinhança, que ia até a casa, para ver a novidade. Logo se notaram os efeitos, com gente sofrendo os primeiros efeitos, procurando ajuda médica nos postos de saúde pública da cidade.
Notícia trombeteada, que se espalhou rapidamente pelo país e, aos poucos, pelo mundo. Pânico em São Paulo - Hebe Camargo dizia que Goiânia e os goianienses deviam ser evitados e segregados. Eu, que morava no Setor Aeroviário e passava pelo centro da cidade todos os dias, voltando da faculdade, ficava espantado com aquele pânico, que me parecia inexplicável, ante às providências tomadas.
O governador Santillo recebeu ajuda imediata do governo federal, através dos técnicos da CNEN - Comissão Nacional de Energia Nuclear, que tomou conta de tudo - isolou parte d acesso ao bairro Popular e interditaram a entrada na rua 57. Mais pânico - e piada dos brasilienses, por exemplo: "sabe como reconhecer um goiano? É só coloca-lo no escuro, para ver se brilha!".
Santillo foi para São Paulo, e procurou a imprensa. Médico e administrador enérgico e bem informado, rebateu o pânico e esclareceu tudo. Era um acidente radiológico e, não nuclear, a radiação não ia se espalhar além do local, não se cansava de repetir. Foi dando certo.
Mais de oitenta contaminados. Leide das Neves, cara de baianinha linda, internada e em coma.
Siron Franco, que havia morado na rua 57, chocado com o fato, deixou São Paulo e ocupou uma casa na rua 54 e fez dela um estúdio. Hipnotizado pela tragédia e pelos fatos, pirou, e enquanto assistia a tudo na quase dezena de televisores espalhados pela casa, produzia uma série lancinante de quadros, retratando o fato.
E dava entrevistas, e fazia o que era possível para denunciar a tragédia e, ao mesmo tempo, afastar o preconceito. - entrementes, um crítico se comprazia em taxa-lo de oportunista, através de um jornal.
E a coisa foi indo, malgrado o sofrimento inexorável dos atingidos, a despeito do apoio do governo estadual. Os técnicos da CNEN e os servidores da Secretaria de Saúde deram conta do recado. O imóvel onde foi o epicentro de tudo foi colocado abaixo e seu chão escavado e concretado.
Mas, entre os atingidos pela contaminação radioativa do césio 137, a coisa se complicava - sofrimento, desespero, amputações de membros, e mortes . Leide se foi. No enterro dela, presenciado por pouco mais de uma dezena de corajosos familiares, chegou o vereador José Nelto e sua trupe, para injuriar a inocente, apredejando seu caixão.
E os goianienses e goianos, vivendo experiências pouco confortáveis, ao cruzar o rio Parnaíba.No setor Aeroviário, região oeste da cidade, sensação de distância e, ausência de perigo, imediato ou próximo.
Atualmente, o depósito de material contaminado da rua 57 é modelo e roteiro obrigatório dos estudantes da rede pública de ensino. E os goianienses parecem preferir não se recordar do fato.
Uma história (que parece uma piada curta e grossa) que ouvi hoje me fez voltar ao tempo e recordar tudo. A história é esta:
Rio de Janeiro. Barreira policial - fiscalização de trânsito - "documentos por favor". "Ué!, em Goiânia não está todo mundo morrendo de Césio?". Mudez. E depois, ríspida resposta: "Olha, sargento, estão morrendo bem menos goianos de Césio do que cariocas de Aids." De fato - meados dos anos 80 e...
O tempo fechou.
Um link para os quadros de Siron Franco sobre a tragédia da rua 57:
http://ardotempo.blogs.sapo.pt/2009/02/17/
Por Se Gyn
Uma bomba de aparelho de radiologia irresponsavelmente abandonada num terreno baldio no centro da cidade foi levada por catadores de sucatas e aberta, com a intenção de retirar o chumbo, para ser vendido, em 1987.
Tragédia.
Acharam graça no efeito luminescente do Césio 137 - cujos grânulos guardaram numa vasilha. À noite, eles brilhavam intensamente no escuro e, a linda e pequena Leide, consumiu alguns deles. A contaminação radiológica rapidamente se espalhou entre a vizinhança, que ia até a casa, para ver a novidade. Logo se notaram os efeitos, com gente sofrendo os primeiros efeitos, procurando ajuda médica nos postos de saúde pública da cidade.
Notícia trombeteada, que se espalhou rapidamente pelo país e, aos poucos, pelo mundo. Pânico em São Paulo - Hebe Camargo dizia que Goiânia e os goianienses deviam ser evitados e segregados. Eu, que morava no Setor Aeroviário e passava pelo centro da cidade todos os dias, voltando da faculdade, ficava espantado com aquele pânico, que me parecia inexplicável, ante às providências tomadas.
O governador Santillo recebeu ajuda imediata do governo federal, através dos técnicos da CNEN - Comissão Nacional de Energia Nuclear, que tomou conta de tudo - isolou parte d acesso ao bairro Popular e interditaram a entrada na rua 57. Mais pânico - e piada dos brasilienses, por exemplo: "sabe como reconhecer um goiano? É só coloca-lo no escuro, para ver se brilha!".
Santillo foi para São Paulo, e procurou a imprensa. Médico e administrador enérgico e bem informado, rebateu o pânico e esclareceu tudo. Era um acidente radiológico e, não nuclear, a radiação não ia se espalhar além do local, não se cansava de repetir. Foi dando certo.
Mais de oitenta contaminados. Leide das Neves, cara de baianinha linda, internada e em coma.
Siron Franco, que havia morado na rua 57, chocado com o fato, deixou São Paulo e ocupou uma casa na rua 54 e fez dela um estúdio. Hipnotizado pela tragédia e pelos fatos, pirou, e enquanto assistia a tudo na quase dezena de televisores espalhados pela casa, produzia uma série lancinante de quadros, retratando o fato.
E dava entrevistas, e fazia o que era possível para denunciar a tragédia e, ao mesmo tempo, afastar o preconceito. - entrementes, um crítico se comprazia em taxa-lo de oportunista, através de um jornal.
E a coisa foi indo, malgrado o sofrimento inexorável dos atingidos, a despeito do apoio do governo estadual. Os técnicos da CNEN e os servidores da Secretaria de Saúde deram conta do recado. O imóvel onde foi o epicentro de tudo foi colocado abaixo e seu chão escavado e concretado.
Mas, entre os atingidos pela contaminação radioativa do césio 137, a coisa se complicava - sofrimento, desespero, amputações de membros, e mortes . Leide se foi. No enterro dela, presenciado por pouco mais de uma dezena de corajosos familiares, chegou o vereador José Nelto e sua trupe, para injuriar a inocente, apredejando seu caixão.
E os goianienses e goianos, vivendo experiências pouco confortáveis, ao cruzar o rio Parnaíba.No setor Aeroviário, região oeste da cidade, sensação de distância e, ausência de perigo, imediato ou próximo.
Atualmente, o depósito de material contaminado da rua 57 é modelo e roteiro obrigatório dos estudantes da rede pública de ensino. E os goianienses parecem preferir não se recordar do fato.
Uma história (que parece uma piada curta e grossa) que ouvi hoje me fez voltar ao tempo e recordar tudo. A história é esta:
Rio de Janeiro. Barreira policial - fiscalização de trânsito - "documentos por favor". "Ué!, em Goiânia não está todo mundo morrendo de Césio?". Mudez. E depois, ríspida resposta: "Olha, sargento, estão morrendo bem menos goianos de Césio do que cariocas de Aids." De fato - meados dos anos 80 e...
O tempo fechou.
Um link para os quadros de Siron Franco sobre a tragédia da rua 57:
http://ardotempo.blogs.sapo.pt/2009/02/17/
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