terça-feira, 14 de abril de 2015

Prosa poética de Joaquim Nogueira


Prosa poética de Joaquim Nogueira



 ... A MEDIDA DO AMOR; … o tempo demasiadamente lento; …Em frente ao espelho da cómoda do teu quarto 



... A MEDIDA DO AMOR



...um dia, há milénios passados, perguntei se amar tinha medida, ou peso, ou tamanho; nessa altura, a minha caminhada ainda era prematura e ainda muito «verde» nos caminhos da vida… e nunca ninguém me soube responder e eu, ainda que repetindo a pergunta muitas vezes, nunca sabia «como» amar; se amar deste tamanho, se amar com este peso, se amar de determinada forma ou feitio… se amar tivesse medida eu queria amar com o máximo que ela tivesse...

um dia, há milénios passados, deixei de me preocupar com a forma, com a medida do Amor; pela simples razão de que, durante toda a minha demanda, jamais houvera encontrado essa mesma bitola, essa fita métrica ou essa balança... e foi nesse momento, quando deixei de procurar como é que deveria Amar, de que forma é que deveria «usar» o Amor (como que fosse um componente para se fazer um bolo), que eu descobri que o Amor não tem medida...

o Amor jamais se pode medir, o Amor apenas, é... é amando, é dando-nos completamente numa entrega absoluta, que se consegue amar... e quem o conseguir fazer, para além de tudo o que possa transmitir aos outros, será ele mesmo, uma pessoa inteiramente feliz... não, não amo muito... não, não amo com todas as forças da minha alma... não, não enlouqueço...
 ...amo, apenas...

 

 … o tempo demasiadamente lento

 … o tempo demasiadamente lento… as horas e os dias demoram eternidades… sente-se a pressa e as saudades… é preciso que as horas voem… é preciso que a manhã do dia seguinte surja rápida com a certeza de mais um dia que passou… é menos um dia na contagem voraz de quem sente desejo de um novo encontro para sentir a tal paz…

a serenidade do abraço que nada tem de sereno mas de forte, de pura ternura e ao mesmo tempo de paixão… rege-se então a dádiva da presença… gostosa… imensa… e os corpos se abraçam num rodopiar sem fim, num beijo prolongado, doce, com sabor a jasmim… e a ternura e o amor não termina ali… prolonga-se na alma do sentir que se ama… perde-se então a noção do tempo que se ganhou na espera…

é um momento mágico aquele em que enlaçados, deixamos de ser o que somos para passarmos a ser o beijo de um tão doce e eterno desejo…

 

 …Em frente ao espelho da cómoda do teu quarto

 ...Em frente ao espelho da cómoda do teu quarto, sentada num banquinho forrado a tecido de cortinado vermelho, penteavas os teus cabelos, num ritual que funciona mesmo sem dares por isso… a escova passava ora uma, ora duas vezes, de cima para baixo e alisava os teus cabelos sedosos, cor de mel e de marfim… brilhavam no espelho e te revias momento a momento numa expectativa de mudança, o que não acontecia pois não podias ficar mais bela do que aquilo que já eras… a beleza em ti não residia nem morava … era!…

A tua camisa de noite, acetinada bege, de rendas sobre o peito alvo de seios firmes e redondos, deixava transparecer a cor da tua pele suave e doce ao olhar sem ser preciso tocar… a tua cama de lençóis de prata, aguardava o teu corpo numa ânsia sensual de quem à noite, só, te espera num desespero de intocabilidade… e tu, demoravas…

da cómoda tiraste um frasquinho de perfume e te ungiste com ele o que provocou um agradável respirar a todos os móveis que te rodeavam… e a tua cama, ansiava pela tua presença… e o teu corpo demorava a conceder-lhe esse desejo… levantaste-te de frente do espelho e te miraste novamente de corpo inteiro e gostaste da tua imagem alva e bela naquele quarto iluminado pela tua presença… olhaste de soslaio e sorriste… sentaste-te na beira da cama e esta suspirou docemente perante a antevisão de que breve te possuiria…

Tiraste os teus pezinhos leves de dentro dos chinelos de cetim vermelho, levantaste um pouco o lençol e te entregaste total e lentamente ao prazer de estender do teu corpo e da entrega final ao teu leito… a tua cama nem sequer se moveu… aquietou-se para não te perturbar, para que não te arrependesses daquilo que acabaras de fazer, com medo que te levantasses e ela te voltasse a perder… a tua cama inspirou baixinho a fragrância do cheiro da tua pele e deixou-se ficar aguardando o teu próximo movimento… deitada de bruços te deixaste finalmente ficar e tua cabeça leve pousada de mansinho na almofada, arfava lentamente o teu respirar de prazer por mais uma noite de descanso e de sonhos…

Teus olhos semicerrados viram a lâmpada acesa e teu braço se estendeu ao interruptor da mesinha de cabeceira para a desligares... os teus movimentos eram propositadamente lentos para que o tempo demorasse ainda mais do que aquele que já existia… e a tua cama sentia… na obscuridade do teu quarto, teus olhos semicerrados olharam o tecto e se fixaram na sua alva cor que permitia uma réstia de luz no meio da escuridão… olhaste a janela e pelas frinchas da persiana, divisaste a luz cinzenta duma lua crescente… avizinhava-se uma noite de lua cheia e teu corpo descansou por um momento…

a tua cama então suspirou e te abraçou fortemente… em suas mãos te acabavas de entregar… e o sono chegou…. adormeceste… não sei mais o que se passou… a noite decorreu, teu corpo diversas vezes se moveu… a tua cama não se movia, com receio de te acordar... abraçava-te sempre para não te deixar fugir… sentia-te sua e possuía-te num sonho imenso de impossibilidade, de impotência, de raiva, por não te conseguir ter tendo-te ali… tua mente adormecida, movia-se e sabia-se que sonhavas… a tua cama te tinha ali, indefesa, sozinha… sonhavas e eu aqui, nada mais te pedia… nada mais desejava… queria apenas ser o teu sonho…




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