BRINCANDO COM PAPAI
Texto de Antônio Carlos Affonso dos Santos (ACAS)
Se um dia papai voltasse, eu tentaria viver com ele tudo aquilo que sempre quis e nunca aconteceu. Ah, se eu pudesse voltar o tempo! Papai iria brincar comigo. Não chegaria cansado, nem estressado, nem nervoso, nem dopado, nem triste. A luta, para seus filhos terem alguma coisa no futuro, não o deixou viver o presente.
Hoje ele é passado. Papai morreu quando eu tinha dezoito anos de idade; ele tinha à época, pouco mais de cinquenta. Ele nunca participou de minha adolescência; menos ainda, por Deus o ter levado tão cedo, da minha chegada à idade adulta.
Ah, se papai me abraçasse, ao menos uma única vez; eu diria a ele que o amava. Quem sabe assim ele e eu perdêssemos nossa timidez?
Se papai me abraçasse, eu lhe daria um presente: uma máquina do tempo!
Ai então, eu ligaria meu «transformador de gente» e o faria ser menino de novo. Eu próprio entraria na máquina e nós dois, meninos; finalmente brincaríamos como só as crianças sabem brincar.
Cansados, eu o olharia embevecido, enquanto nova transformação ocorreria; eu e ele, aos poucos íamos ficando velhos. Fecharíamos nossos olhos e nos elevaríamos acima das casas, das ruas, das luzes, das cidades, do país e do mundo. Quem sabe finalmente eu veria a Europa, que tanta vontade tenho de conhecer e não pude; nem poderei.
Se um dia papai voltasse e eu pudesse conviver com ele tudo aquilo que quis e que nunca aconteceu, eu o acompanharia até a presença do Pai Eterno.
Reclamaria Dele, a falta de tempo que papai teve e do fato dele não me ver crescer. Ah, se eu pudesse voltar o tempo!
Se eu pudesse voltar o tempo, papai iria brincar comigo até o fim dos tempos. Eu, morto que estou, finalmente brincaria com papai.
Se um dia, você leitor, ouvir cantigas de roda, catiras batidas na mão e nos pés, ouvir sabiás cantando numa praça mal cuidada da cidade grande, ou ver um caipira lavrando a terra, saudado pela natureza, saiba leitor, será eu e meu pai, nos divertindo na eternidade; visto que na vida pouco nos divertimos.
Vocês ainda nos virão nos sorrisos ocultos dos personagens das estátuas que contam a história da terra bandeirante, em cada praça onde quer elas estejam.
Vocês nos ouvirão nos gorjeios dos canários da terra, dos coleirinhas, dos curiós, dos pintassilgos, no farfalhar das folhas dos jequitibás, nas flores dos ipês que os tornam sagrados, nas algazarras das crianças, nos curumins e cunhãs do Mato Grosso, que apreciaram um texto desse velho escrevinhador que, se não deixou filhos, foi abençoado por Deus com o dom de ver e ouvir estrelas, apreciar a natureza e entendê-la e a amar sua querida Dirce, despudoradamente.
Foi uma pena, meu pai, que não houvéssemos brincado mais com a vida, de não ter ouvido mais música caipira, de ter sorrido mais, como os curupiras e sacis que me acordaram hoje, só para que eu pudesse escrever este texto.
Pai, até breve! Não se perca de mim; não me desapareça.
ACAS
Texto de Antônio Carlos Affonso dos Santos (ACAS)
Se um dia papai voltasse, eu tentaria viver com ele tudo aquilo que sempre quis e nunca aconteceu. Ah, se eu pudesse voltar o tempo! Papai iria brincar comigo. Não chegaria cansado, nem estressado, nem nervoso, nem dopado, nem triste. A luta, para seus filhos terem alguma coisa no futuro, não o deixou viver o presente.
Hoje ele é passado. Papai morreu quando eu tinha dezoito anos de idade; ele tinha à época, pouco mais de cinquenta. Ele nunca participou de minha adolescência; menos ainda, por Deus o ter levado tão cedo, da minha chegada à idade adulta.
Ah, se papai me abraçasse, ao menos uma única vez; eu diria a ele que o amava. Quem sabe assim ele e eu perdêssemos nossa timidez?
Se papai me abraçasse, eu lhe daria um presente: uma máquina do tempo!
Ai então, eu ligaria meu «transformador de gente» e o faria ser menino de novo. Eu próprio entraria na máquina e nós dois, meninos; finalmente brincaríamos como só as crianças sabem brincar.
Cansados, eu o olharia embevecido, enquanto nova transformação ocorreria; eu e ele, aos poucos íamos ficando velhos. Fecharíamos nossos olhos e nos elevaríamos acima das casas, das ruas, das luzes, das cidades, do país e do mundo. Quem sabe finalmente eu veria a Europa, que tanta vontade tenho de conhecer e não pude; nem poderei.
Se um dia papai voltasse e eu pudesse conviver com ele tudo aquilo que quis e que nunca aconteceu, eu o acompanharia até a presença do Pai Eterno.
Reclamaria Dele, a falta de tempo que papai teve e do fato dele não me ver crescer. Ah, se eu pudesse voltar o tempo!
Se eu pudesse voltar o tempo, papai iria brincar comigo até o fim dos tempos. Eu, morto que estou, finalmente brincaria com papai.
Se um dia, você leitor, ouvir cantigas de roda, catiras batidas na mão e nos pés, ouvir sabiás cantando numa praça mal cuidada da cidade grande, ou ver um caipira lavrando a terra, saudado pela natureza, saiba leitor, será eu e meu pai, nos divertindo na eternidade; visto que na vida pouco nos divertimos.
Vocês ainda nos virão nos sorrisos ocultos dos personagens das estátuas que contam a história da terra bandeirante, em cada praça onde quer elas estejam.
Vocês nos ouvirão nos gorjeios dos canários da terra, dos coleirinhas, dos curiós, dos pintassilgos, no farfalhar das folhas dos jequitibás, nas flores dos ipês que os tornam sagrados, nas algazarras das crianças, nos curumins e cunhãs do Mato Grosso, que apreciaram um texto desse velho escrevinhador que, se não deixou filhos, foi abençoado por Deus com o dom de ver e ouvir estrelas, apreciar a natureza e entendê-la e a amar sua querida Dirce, despudoradamente.
Foi uma pena, meu pai, que não houvéssemos brincado mais com a vida, de não ter ouvido mais música caipira, de ter sorrido mais, como os curupiras e sacis que me acordaram hoje, só para que eu pudesse escrever este texto.
Pai, até breve! Não se perca de mim; não me desapareça.
ACAS
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