quinta-feira, 2 de abril de 2015

Ode ao Quinhentão - Poema de Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS


Ode ao Quinhentão

Poema de Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS

(Esta poesia foi feita em sala de aula, durante Curso Livre de Poesias e Literatura Brasileira, no distante ano de 2000)

I

A bruxa vestida de negro
 Com muitas verrugas e muitos pêlos
No nariz, pilota vassoura
 Já gasta puída, careca
 Que o diabo à guinchar agoura.

II

O que é o Brasil, que ninguém vê?
 -Zunzuns, assovios, vastos gritos
 Permeiam a mata, onde o ipê
 Se destaca, belo altaneiro:
 Onde mora o saci pererê.

III

Montado num porco, o caipóra
 Vigia gnomos brasucas e Yara
 Mãe d’água, que sonha com botos
 Que atraem moças virgens pro rio...
 E o curupira que vigia as matas
 Por cinco e longos séculos à fio
 Pra que não se façam queimadas
 Nem deixar que poluam as cascatas
 Onde se banha Yemanjá.
 O esforço parece que é vão...

IV

Matas tantas, quantas, imensas
 Manacás, mandaquis, jabotis
 Mangabas, goiabas, sapotis
 Que o fogo aos poucos consome...
 Fechemos nossos olhos à dor
 Joguemos sal por sobre os ombros
 -Que vá de retro, lobisomem.

V

São os entes imaginários
 Que povoam nossas cabeças
 Antropofagia de mários
 Provocando muitos enleios
 Bois-mamão, bumbá e as mulas
 Sem cabeça, são os cavalos
Marinhos, reizados, catiras
 E o negrinho do pastoreio
 Cabeça urbana, pés caipiras.

VI

Justifica-se o meu Brasil
 Tão caboclo, caipira, gentil
 Tão audaz, sereno, dolente
 Esse mulato insoneiro
 Ainda moço, só quinhentão
 Que crê: para ser brasileiro
 E preciso amansar barbatão
 E com meia braça de corda
 Chegar um touro ao mourão
 E preciso calçar esporas
 E cair muitos, muitos tombos
 E sentir o ardor das chibatas
 E fugir para poucos quilombos
 E ter na cabeça um mote
 Paciência, a mais não poder
 E muito peso no cangote
 Fazer verso de pé quebrado
 E sofrer, viver o agora
 Ser índio, ou mulato indolente
 Contar «causos», onde se gabe
 Que o Brasil é terra da gente!

Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS





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