quinta-feira, 30 de julho de 2015

Tabuí e seus Causos - INCIDENTE NA JARDINEIRA - PALAVRA DE BÊBADO VALE?


Tabuí e seus Causos

INCIDENTE NA JARDINEIRA

O Tié, caipirim miudim e timiduzim embarcou, nos tempos de antigamente, na jardineira que transportava o povo de Belzonte pra Tabuí. Ao seu lado, bem na janela, um “armário” engravatado, pesando mais de uns cento e vinte quilos, alto demais da conta e com cara de lutador de alguma coisa, no maior ronco.

Já bem depois da metade da viagem, o Tié, de tanto ver curva, cheirar poeira com cecê misturados com fedor de gasolina, começa a ficar enjoado e a virar o zoinho. Foi fono, foi fono, até que não aguentou mais e entregou os pontos.

Despejou tudo o que tinha comido – pão de queijo, sanduíche de mortadela, pastel de queijo, linguiça frita, ovo cozido e mais umas doze coisinhas diferentes – bem no peito do colega de viagem.

E aquilo, além de encher os bolsos do paletó, ficou escorrendo entre este e a camisa do companheiro viajante. No desespero, suando frio, cheirando inhaca, limpando a boca e o bigodim com a manga da camisa, Tié queria sumir no mundo, descer da condução ou, no mínimo, mudar de lugar, mas a jardineira tava lotada e não parava pra nada.

O “armário” nem tium. Continuava puxando o sono e roncando, com a boca aberta.

Pouco antes de chegar a Tabuí, o monte de homem acorda, sente o cheiro estranho – cheiro não, fedentina braba - e passa a mão naquele peito melecado e gosmento. Quando olha, desconfiado, confuso e indignado pro Tié, este bate a mão no ombro do vizinho de banco e pergunta, carinhoso e cheio de dedos:

- Cumpanhero, cê miorô?... Tá mais mió?... Tá?

©By Eurico de Andrade, in Tabuí e seus Causos



PALAVRA DE BÊBADO VALE?

Dois negociantes da cidade grande resolvem sair pelo interior a fora a fim de passar a perna na capiauzada.

Foi aí que chegaram em Tabuí, cidadezinha alterosa. Lá num boteco de um cantinho da cidade, caladinho, sentado num tamborete, estava o velho Vito. Cavalinho piquira lá fora esperando o dono tomar umas e outras para depois carregá-lo com toda paciência para casa.

Só que o velho Vito, capiau desconfiado e esperto, sem nem um tostão no bolso, estava esperando alguém para também dar um golpe.

Quando os dois bacanas entram no boteco, tendo visto o cavalinho lá fora, olham gulosos para o velho. E este, vendo os dois, mira sedento nos olhos de cada um e faz aquele ar tristonho de capiau sofredor e ignorante.

E o Vito, mesmo olhando a importância dos dois, pensa com os seus poucos botões: "pra quem tá com fome e com sede duma branquinha, formiga é pimenta do reino. Vô enguli essas duas formigonas engravatadas..."

- Não quer vender o cavalo, meu amigo?

- Vendo uai! Vinte mil mango é o preço dele. Quem pagá leva!
Os negociantes se entreolham e resolvem executar um plano que já tinha dado certo diversas vezes. Encher de cachaça o vendedor para levar o animal praticamente de graça.

- Não quer acompanhar a gente num traguinho, meu amigo?
- Carece não, moço! vô injeitá! Responde o velho Vito já arrependido da resposta. Boca seca. Sede danada duma branquinha queimadeira.

- Eu insisto, meu amigo! Venha pra junto de nós!
O velhinho sai, morrendo de humildade, do seu cantinho, e de uma golada só entorna no bucho meio copo de cachaça e ainda lambe os beiços.

Os negociantes gostaram da reação do velho e pensam: "já está no papo". Mandam encher outro copo que o velho Vito entorna novamente de uma golada só.
- Quanto é mesmo o cavalinho, meu amigo?
- É trinta. Trinta mil mango é o preço dele. Quem pagá leva.

Os dois da cidade grande se olham meio assustados; Pedem mais uma talagada para tirar a dúvida, e o velhinho emborca tudo de uma só virada.
- O cavalinho é quanto mesmo, meu amigo?
- É corenta. Corenta mil mango. Quem pagá leva.

Depois de mais uns três copos da branquinha, com o velho Vito já bêbado, de quatro e trocando as palavras, o cavalinho já estava custando setenta mil paus.

Os dois negociantes cada vez mais assustados e ficando sem graça com a história. Entornam mais bebida no velho.
- E o cavalinho, velho, diga quanto você quer por ele?

- Ieu? Hic... Quero nada não, moço! Hic... Num é pra vendê mais não! Hic... Ia vendê ele pra tomá uns golo. Já tomei dimais da conta, agora vendo mais meu amiguinho não, uai! Hic!...

©By Eurico de Andrade, in Tabuí e seus Causos

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