terça-feira, 2 de junho de 2015

My Blueberry Nights - Crônicas da madrugada - Querer é poder? - Por Cynthia Kremer


My Blueberry Nights - Crônicas da madrugada

Querer é poder?

Coisas que me irritam (muito!)

Por Cynthia Kremer

Frases e livros de auto-ajuda: aqueles bem medíocres que te dizem que "quando você quer muito algo, o universo conspira em seu favor!" Agora me digam: existe raciocínio mais cretino do que este? Porque se não fosse este um sofisma inescrupuloso e sem nenhum embasamento, todos, sem exceção, estaríamos bem, num mundo idílico, teríamos o que quiséssemos e o que pedíssemos, não é verdade?

E no entanto, não é isso que se vê. 95% da população do mundo vive em estado de certa frustração, cheia de privações, sem conseguir sequer chegar perto de seus sonhos. E garanto a vocês que não é por falta de "querer" com fervor, de pedir "a Deus, aos santos, aos Orixás, ao universo", entre outros. Nestes 5% incluem-se os autores destas obras de esperteza que se auto-ajudam muito bem, pois de tolos, não têm nada.

O que estas frases e livros fazem na verdade, é prestar um desserviço a um número enorme de pessoas, levando os crédulos, incautos e desesperados, a crer que isto é uma verdade absoluta.

E por mais que peçam, não conseguem. E mais ainda se frustram. Estes livros dão falsa esperança, aliás, dão uma vírgula! Vendem! (e muito) a idéia "mágica" de que é tudo fácil. Basta querer muito, junto com alguns rituais imbecis, que você alcançará seus sonhos. O que é péssimo, de extremo mau gosto, além de ser charlatanismo.

Não os acho nem um pouco acima dos que vendem sonhos por R$30,00 lendo a palma da mão, jogando tarô ou com uma bola de cristal, com a promessa de devolver o homem amado em no máximo três dias, ou de que você vai conseguir aquela promoção no trabalho que anseia há tanto tempo: o princípio é o mesmo.

Lucrar em cima da urgência dos que necessitam de alguma coisa. Seria apenas mais uma bobagem com a mesma inutilidade das tantas outras leituras rasteiras, rasas e sem conteúdo, não fossem tão perniciosos.

A minha crítica em relação ao livro e mais precisamente à frase – que é atribuída a diversos escritores, dentre eles um brasileiro – não poderia ser mais profunda porque a tese em si é muito rasa e sem conteúdo suficiente para maiores dissertações. Ela esgota-se nela mesma com a simplória promessa mágica de que “basta querer muito algo que o universo irá conspirar em seu favor”.

Como acho esse tipo de indução a erro com fins lucrativos muito aviltante, escrevi com indignação.

Geralmente os escritores de livros de auto-ajuda vendem fórmulas prontas e muito fáceis, pois os que compram esses livros estão passando por momentos difíceis, desesperados por razões diversas e anseiam por uma solução rápida que dê fim aos seus problemas.

Sabemos que não existem “pensamentos mágicos” que nos tirem de qualquer situação indesejada sem trabalho, sem esforço e sem algum tipo de sacrifício ou sofrimento.E quando eu digo que a frase esgota-se nela mesma, é porque não há nenhum embasamento na sua veracidade, muito pelo contrário.

Hipoteticamente falando, claro, vou dar um exemplo bastante prosaico: num dia de Fla-Flu, um grupo de torcedores dos respectivos times que leram o tal livro, irão torcer e pedir muito ao universo que seu time ganhe e, a não ser que dê empate, um deles sairá vitorioso. Então devemos concluir que o grupo do time que perdeu não pediu com afinco, não quis o suficiente ou com tanto fervor quanto o outro?

Ou ainda: se Pedro, que ama Lia e pede muito ao universo que seu amor seja correspondido, pois leu e acredita na frase, fica muito angustiado ao perceber que Lia não lhe corresponde os sentimentos, pois assim como Pedro, Lia também pede muito ao universo para que João se apaixone por ela, e assim sucessivamente.

Pedro teria perdido o seu amor porque pediu pouco, ou será porque Lia ama mesmo outro homem e nunca irá corresponder ao amor de Pedro, assim como João também não corresponderá a Lia, pois ama outra?

Sairão todos frustrados e, pior ainda, desgastados nessa historinha banal e cruel como é a vida real. Se Pedro e Lia fossem mais realistas e cautelosos, saberiam que o universo - ou qualquer outra metáfora que indique uma força superior - não dá a mínima, talvez sofressem menos e, certamente, não perderiam tanto tempo em vão caso não acreditassem em “pensamentos mágicos” para que seus desejos se realizassem.

A questão é que ao invés do bem, acreditar que basta querer muito alguma coisa sem nada fazer a respeito, é um desserviço e um tremendo engodo para com os incautos, crédulos e desesperados, mas parece ser um ótimo serviço para esses autores que vêm se locupletando com fórmulas mágicas que pipocam a cada dia.




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