sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

A esfinge de Édipo - Por Daniel Teixeira


A esfinge de Édipo

Por Daniel Teixeira


Todos nós sabemos que a famosa esfinge colocou a Édipo uma pergunta à qual ele respondeu correctamente. Sabemos que a Esfinge é um monstro, temos uma ideia daquilo que deverá ser a figura de um monstro mas pouco sabemos, em geral, sobre a Esfinge. Na verdade sempre nos interessou mais saber da correcção da resposta de Édipo do que da Esfinge.

Reza a história (das esfinges) que ela é fruto dos amores incestuosos da temível Equina e de seu filho Ortros, o cão de Gérion. Contudo, reza também a lenda que Hera (mulher de Zeus) a colocou às portas de Tebas a fim de punir esta cidade e o seu rei, Laios - pai de Édipo - culpado de amores contra a natureza com o efebo Críssipos.

Ou seja, a Esfinge, nascida do pecado, como se viu acima, é colocada  à entrada de uma cidade para punir um outro pecado, que, por acaso se passa com o pai de Édipo (este último pecado que será a famosa homossexualidade).

Como se fosse por acaso, e não se vá criticar de falta de imaginação os lendadores, a colocação da esfinge é feita no lado ocidental (não no lado oriental, não no lado norte, não no lado sul) e apresenta um enigma a cada viajante que se não lembre de entrar pelos restantes três lados da cidade, ou que se não lembre simplesmente de entrar pelo lado Ocidental mais ao lado Norte ou ao lado Sul do que o local onde está colocada a Esfinge. Aqueles que se não mostram capazes de resolver o enigma apresentado pela esfinge são devorados pelo monstro sanguinário.



Mas, apresentemos o monstro himself: A esfinge parece usar uma estranha máscara, de tal modo a sua face é impassível e já enigmática, daí que o termo esfíngico seja aplicado à falta de mobilidade expressiva.

Os seus olhos, imutavelmente vazios, parecem esconder alguma coisa de feroz e implacável, isto no seu desenho inicial, segundo se diz, desenho este (imaginado claro) que vem do tempo anterior aos deuses gregos, do tempo dos Titãs.

Aquela esfinge do Édipo, recriada pelos gregos já no tempo dos deuses, é, no entanto, feminina, sem dúvida, uma vez que a dúvida ficava em aberto na anterior descrição, não havendo definição de parecenças de género.

O seu corpo adelgaça-se (típico da definição feminina) ao ponto de se tornar o de uma leoa (também tipicamente feminina a descrição embora no plano temperamental) e o peito aparece, tal como a face, totalmente feminino.

Um pormenor andrógino, para aligeirar, e talvez como concessão envergonhada à anterior imagem - a original titânica - é o nascimento de asas no dorso, que mais tarde vem a funcionar como ideia antecipatória da conhecida figura do anjo que conhecemos hoje e sabemos que não tem género (nem masculino nem feminino) mas que aparenta ter sexo masculino.

O volume de personagens nestas lendas, gregas e posteriores, incluindo as romanas, embora enverede um pouco pela dispersão nalguns casos, bifurcando-se seguindo intervenções de vários deuses, acaba por se restringir neste plano quando se trata de descrever factos que relevem.

Parece haver da parte dos lendadores, provavelmente não os iniciais mas aqueles que deram seguimento ao contado uma intenção de simplificar de forma a facilitar a transmissão oral. Neste caso, e conforme veremos  mais à frente, a história de Édipo e da Esfinge aparece mesmo amputada de uma parte na sua versão mais conhecida.

Na verdade foram feitas pela Esfinge duas perguntas a Édipo e todos nós conhecemos largamente uma, mas não conhecemos pelo menos tão largamente a segunda.

A primeira é a tradicional pergunta sobre qual é o animal que tem quatro pés de manhã, dois ao meio-dia e três à noite. É o homem, que na sua infância caminha sobre pés e mãos, que na idade adulta (meio-dia) se ergue sobre os dois pés e na velhice (noite) se apoia no cajado para caminhar.

Mas a outra, é assim: "Quais são as duas irmãs uma das quais dá nascimento à outra que por sua vez faz nascer a primeira?!"

A esta circular pergunta, respondeu Édipo: "Trata-se do Dia e da Noite!" (Aqui interessa dizer que Dia é feminino em grego o que nos faria esbarrar a nós que utilizamos o masculino para definir Dia).

Tendo assim acertado Édipo, a esfinge soltou um rugido terrível e acabou por se precipitar do alto da penedia, matando-se.

Por isso, e como conclusão, não nos esqueçamos nunca que a Édipo foram colocadas duas questões, uma que tem a ver com o homem e outra que tem a ver com o Universo. 

Seria contudo curioso analisar porque razão ambas as perguntas são basilarmente contraditórias porque a primeira fala de animal para definir o homem e a segunda fala do ser humano (duas irmãs) para apontar para o Universo. 


  

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