domingo, 3 de maio de 2015

Poesia de Virgínia Teixeira


Poesia de Virgínia Teixeira


Narciso bravio


Campo imenso de altivos girassóis amarelos viçosos
Prado dourado repleto de flores que gritam alegria
Girassóis que sonham alcançar o Sol, tão ambiciosos!
Flores viçosas que sobrevivem às estações com mestria

Campo imenso de flores arrancadas pela raiz cruelmente
Prado frio e triste de terra quase estéril,  seca e salgada
Onde alguém, ainda com fé, planta uma túlipa docemente
“Cresce, flor delicada como cristal”, é a prece murmurada

E o jardineiro senta-se no topo da colina a vislumbrar o prado
E espera que a túlipa vingue no vento gélido que sopra forte
Mas a flor enrosca-se na terra fria e espera satisfeita pela morte

O jardineiro, sentado no topo da colina, desvia o olhar marejado
E vislumbra, num canto esquecido, um narciso bravio a despontar
Vida inesperada num campo triste e frio onde já não vale a pena plantar…


Campo singelo


Campo singelo de margaridas bravias e inocentes
Flores viçosas, alegres, criadas por entre o prado verdejante
Plantas felizes que, se pudessem mover-se, saltitavam contentes
Flores modestas, de beleza selvagem, veias de vida palpitante

Não viram o Sol subir, a cada dia mais um pouco, incapaz de adormecer
Astro flamejante que, sem saber conter-se, lhes cuspiu fogo abrasador
E dias passaram,  o verde esmoreceu e as margaridas viram-se escurecer
Até que um dia o Sol olhou para o prado e viu nele semeada bem fundo apenas dor

As estações sopraram vendavais, derramaram chuva furiosa, mas o prado renasceu
Despontaram devagar, um a um, amarelos e cor-de-laranja viçosos, verdes valentes 
Os narcisos estrangularam as raízes das plantas de dor, e cresceram orgulhosos e insolentes

Prontos para cobrir o mundo de cores e alegria, como um prado que a tudo já venceu
Não sabem que o vento os persegue, e que em breve os vendavais tudo vão arrancar,
E os narcisos vão ser soprados pelo mundo afora, e noutros prados vão vingar…


Nevoeiro


Ela pensa que no nevoeiro denso vai encontrar o que procura
Pensa que nas nuvens gordas de irritação se esconde um abrigo
E que ao mergulhar no nevoeiro cinzento vai encontrar uma cura
Acha que as nuvens escuras a podem esconder de todo o perigo

Ela pensa que no mar calmo de nuvens celestiais vai encontrar o que procura tanto
Não percebe que o nevoeiro, gordo de saudade e revolta, carrega apenas profunda tristeza
Ela não sabe a agrura que cobre de fel as nuvens curiosas, como um angustiado manto
Elas que, curiosas e alvas, desceram do Céu para espreitar, em busca de um mundo de beleza

E se viram aprisionadas à lama do mundo desleal, sujas e manchadas de Humanidade
Mas Ela… Ela não sabe, Ela não ouve os lamentos, não cheira a dor que vagueia pelo ar…
Ela, cega de esperança e desespero, abre os braços sem hesitar, e reza por Liberdade

Ela salta sem temer, porque o peito já não tem lugar para o receio nem quer duvidar
E quando se encontra no ventre do nevoeiro, escuro e fétido, sabe que encontrou
Ali, naquele ventre estéril  Ela encontra o Nada que procurava, a paz por que tanto ansiou…





 

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