Poesia de Francisco Arcos
Poema Introdutório
Aquilo de que o homem despojou as coisas
não lhes faz falta
porque elas continuam a ser do mesmo modo.
Mas há um cavalo de ventas mornas
com patas como qualquer cavalo e asas como nenhum...
(As rédeas são notas agudas de flauta
e o flanco fácil e sereno).
O seu nascer é ininterrupto
para morrer amanhã.
- E tal não acontece ao mesmo tempo por um truque de câmbio,
para que a morte não perca o seu valor extrínseco
nas obsessões da água
e na alegria dos bichos,
enquanto permanece inefável a conjugação de sexos nas árvores.
Mas não bastam as asas ao cavalo:
São necessárias as patas,
imprescindíveis as patas do cavalo
- funcionais, autênticas, terríveis -
porque as patas do Pégaso são falsas
à força de tanto desdobrarem asas subservientes.
Asas? Quase inúteis...
Se as patas forem patas
capazes de bradar no solo surdo,
o céu há-de baixar-se para que o cavalo o penetre.
Caí das mãos de Deus num dia triste.
Caí das mãos de Deus num dia triste.
Não difiro do nada mesmo nada.
Por isso me procuro e pela estrada
pergunto à brisa: - O outro, acaso o viste?
- O outro ( que sou eu ), sombra esfaimada,
que anda nas trevas de punhal em riste,
dize-me tu, luar, se o pressentiste
correndo atrás de mim em fúria alada?
E ergo-me da cor, vivo no som;
sou eco e sombra; existo na paisagem
até ao dia em que acabar no chão.
Caí da mão, desabrochada em céus,
a qual não sei - por erro de miragem -
se me procura, se me diz adeus.
Estirpe e Atavismo
Vejo-me nu nas mãos dum Gulliver. Distantes,
como as memórias dum lusíada marujo,
as minhas farsas de ontem vão, num porão sujo,
na emigração comum dos que procuram o antes.
(No princípio era o Caos? Não creio). E garatujo
cálculos de álgebra que nunca soube: Instantes
da minha mágoa relativa, asas errantes,
porões onde eu, entre barris com álcool, fujo.
Ultrapassei-me. O agora é fútil. Que me importa?
Nas mãos de Gulliver sou como espinha morta
já sem medula.
- Ó rouxinol de Bernardim,
responde antes que caias de entre a fronde:
“ Menina e moça me levaram...” - para onde?
(Há uma reminiscência, um luxo infame e um fim).
Poema Introdutório
Aquilo de que o homem despojou as coisas
não lhes faz falta
porque elas continuam a ser do mesmo modo.
Mas há um cavalo de ventas mornas
com patas como qualquer cavalo e asas como nenhum...
(As rédeas são notas agudas de flauta
e o flanco fácil e sereno).
O seu nascer é ininterrupto
para morrer amanhã.
- E tal não acontece ao mesmo tempo por um truque de câmbio,
para que a morte não perca o seu valor extrínseco
nas obsessões da água
e na alegria dos bichos,
enquanto permanece inefável a conjugação de sexos nas árvores.
Mas não bastam as asas ao cavalo:
São necessárias as patas,
imprescindíveis as patas do cavalo
- funcionais, autênticas, terríveis -
porque as patas do Pégaso são falsas
à força de tanto desdobrarem asas subservientes.
Asas? Quase inúteis...
Se as patas forem patas
capazes de bradar no solo surdo,
o céu há-de baixar-se para que o cavalo o penetre.
Caí das mãos de Deus num dia triste.
Caí das mãos de Deus num dia triste.
Não difiro do nada mesmo nada.
Por isso me procuro e pela estrada
pergunto à brisa: - O outro, acaso o viste?
- O outro ( que sou eu ), sombra esfaimada,
que anda nas trevas de punhal em riste,
dize-me tu, luar, se o pressentiste
correndo atrás de mim em fúria alada?
E ergo-me da cor, vivo no som;
sou eco e sombra; existo na paisagem
até ao dia em que acabar no chão.
Caí da mão, desabrochada em céus,
a qual não sei - por erro de miragem -
se me procura, se me diz adeus.
Estirpe e Atavismo
Vejo-me nu nas mãos dum Gulliver. Distantes,
como as memórias dum lusíada marujo,
as minhas farsas de ontem vão, num porão sujo,
na emigração comum dos que procuram o antes.
(No princípio era o Caos? Não creio). E garatujo
cálculos de álgebra que nunca soube: Instantes
da minha mágoa relativa, asas errantes,
porões onde eu, entre barris com álcool, fujo.
Ultrapassei-me. O agora é fútil. Que me importa?
Nas mãos de Gulliver sou como espinha morta
já sem medula.
- Ó rouxinol de Bernardim,
responde antes que caias de entre a fronde:
“ Menina e moça me levaram...” - para onde?
(Há uma reminiscência, um luxo infame e um fim).
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